segunda-feira, 18 de maio de 2009

Um Show Inesquecível




Ela entrou com dez minutos nobres de tolerância. A rainha dominou o palco no primeiro suspiro. Sua voz sem esforço preenchia cada poro do corpo, eriçava o pelo até daqueles que estavam ali apenas para acompanhar um ou uma fã. A majestade de Maria Bethania impõe-se não só pela voz, mas também por sua postura rica em sentido e sentimento que transbordaram pelo Centro de Eventos do Pantanal, na noite de quinta-feira.

A casa lotada e o silêncio reverente da plateia que ovacionava a cada música impunham mais respeito. Ela abriu com “Nana” e em seguida “Beira-mar”, um sucesso poético cujo refrão guarda uma verdade suave como o vento: “Em todo o mar tem rio, e em todo o seu som tem ar e oxigênio para alimentar a todos nós”.

Em seguida entoou o hino do sertão: “Asa branca”. E o mar adentrou o Pantanal e sua religiosidade atravessou o público com o “Capitão do mato”. Em seu caminho entremeava músicas mais agitadas e mais introspectivas com uma energia de deixar as novas cantoras da MPB brasileira babando na sua verve. “Explode o coração”. Vibra a plateia de pé totalmente dominada e submissa a sua “Estrela D’alva”. Um pé no freio, uma poesia e os “Olhos nos olhos” levantam a multidão. Os aplausos, gritos e manifestações de carinho envolvem a artista, que agradece repetidas vezes: “Obrigada, senhores!”

Então ela se retira do palco após a “Volta por cima” e abre espaço para um show instrumental. Senhores de cabelo branco, média idade e mais novos dão um espetáculo a altura da sua voz enquanto a abelha-rainha respira para retornar ao controle da colmeia. Bateria, percussão rica, violoncelo, contrabaixo acústico, teclado, sanfona e violão, uma corte digna de sua majestade.

Retorna em “Reconvexo” e convida para a Bahia depois de oferecer o “Doce”. Um samba gostoso com cheiro do acarajé e a levada do candomblé. Em seguida introspectivamente, a doçura de um “Sábado em Copacabana”. Os pés no chão, o patuá no peito guardado por dois cavalos marinhos brilhantes davam o tom do figurino simples completado por uma saia estampada e um pulso cheio de pulseiras douradas.

Em ritmo de oração Terezinha dá lugar ao lamento: “Negue, negue que me pertenceu, diga que já não me quer...” E eis que chega uma carta e a poesia eriça o público que responde de pé. “Todas as cartas de amor são ridículas. As cartas de amor têm que ser ridículas. Quem me dera saber no tempo em que as escrevia que eram ridículas. Eu também escrevi cartas ridículas. Mas enfim as pessoas que nunca escreveram uma carta de amor é que são ridículas”.

Uma pausa para agradecer o convite novamente e lembrar da extraordinária Vanessa da Mata. “Em nome dela e de todos os músicos, poetas e artistas desta linda cidade e deste lindo estado, obrigada pelo convite”, suspira Bethânia.

Depois de sonhar um “Sonho impossível”, a gente não quer só “Comida”, a gente quer diversão e arte. A gente quer inteiro e não pela metade. Uma versão pausada e pesada. Uma ordem da rainha, mais arte, desejo, necessidade e vontade.

Então um lamento, uma suave melodia elocubrando as estrelas e a beleza do “Céu de Santo Amaro” recheado pelo Soneto de Fidelidade do inesquecível poetinha Vinicius de Morais. Em seguida um samba para elevar a moral e lavar as lágrimas salgadas da poesia. Como não poderia deixar de ser o bis: “Viver e não ter a vergonha de ser feliz, cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz”.

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